O impacto da qualidade da fonte de cálcio para poedeiras

Rafael Souza

Nutricionista de Aves

14 novembro 2022
-
6 minutos

Quando falamos em nutrição de poedeiras, o cálcio figura dentre os principais nutrientes necessários para o bom desempenho, pois é o mineral mais abundante no organismo e faz parte do sistema esquelético, onde 99% do cálcio do organismo se encontra, além de estar presente em diversas reações metabólicas e formação de tecidos (Suttle, 2010). O cálcio ativa grande número de enzimas tais como adenosina-trifosfatase (ATPase), desidrogenases, succinases e lipases. Este mineral é necessário para manter a permeabilidade da membrana, além de estar envolvido na transmissão da contração muscular e no controle dos impulsos nervosos, assim como na excitabilidade neuromuscular. (Vilar da Silva & Pascoal, 2014).

Por Rafael Souza, Nutricionista de Aves

 

O cálcio é considerado essencial na formulação de rações, já que a falta deste acarreta severas perdas produtivas, além de má formação de tecido ósseo e no controle das funções celulares dos tecidos nervoso e muscular e, também, nas atividades hormonais (VIAPIANA, 2015). Sua absorção depende de vários fatores, incluindo a disponibilidade de minerais, cálcio e níveis séricos de fósforo, vitamina D3, Hormônio paratireóide, pH gastrointestinal, teor de fibra, gordura e granulometria mineral na dieta (Stringhini, 2004).

 

O conhecimento dos níveis ideais de cálcio para cada fase é de suma importância, visto que este mineral é fundamental para a integridade óssea, uma superoferta destes minerais nas dietas, pode ocasionar em aumento nos custos de ração e poluição do meio ambiente. A exigência de cálcio varia de acordo com a idade, à medida que a fase de produção se aproxima os níveis devem ser incrementados, pois a demanda aumenta em mais de 4 vezes quando comparamos as primeiras semanas de vida com as primeiras semanas de produção. Apesar da idade das aves ser um importante balizador para a determinação da exigência, o peso corporal e o consumo de ração devem ser critérios fundamentais para a mudança na dieta. A alta ingestão de cálcio promove uma redução na expressão de mRNA do seus transportadores, pois suas principais vias de absorsção são a transcelular, mediada por transportadores de membrana, e a paracelular, mediada pelas claudinas.

 

Principais fontes de cálcio

A principal fonte de cálcio em dietas animais é o calcário, uma rocha encontrada em abundância em todas as regiões do planeta, apresenta variação em sua composição e por este motivo torna-se necessário uma atenção maior em relação a qualidade, uma vez que precisamos saber o que está complexado a este cálcio, e isto só conseguimos com frequentes análises em laboratório, principalmente para qualificar os fornecedores e sempre buscar fontes confiáveis e de baixa variação. Abaixo um compilado das principais fontes de cálcio utilizadas em rações e sua disponibilidade.

 

Tabela 1. Principais fontes de cálcio utilizados em rações animais

Fonte

% do mineral

Biodisponibilidade

Farinha de ossos autoclavada

29,0 (23-37)

Alta

Fosfato de rocha desfluorizado

29,2 (19,9- 35,7)

Intermediária

Carbonato de Cálcio

40,0

Intermediária

Fosfato mole

18,0

Baixa

Calcário Calcítico

38,5

Intermediária

Calcário Dolomítico

22,3

Intermediária

Fosfato Monocálcico

16,2

Alta

Fisfato Tricálcico

31,0-34,0

Alta

Fosfato Bicálcico

23,2

Alta

Sulfato de Cálcio

20

Baixa

Fonte: Mcdowell (2003), citado por Vilar da Silva & Pascoal, (2014).

 

Impacto da granulometria do calcário no desempenho

O tamanho das partículas dos ingredientes utilizados nas rações influencia a digestibilidade dos nutrientes e compromete o desempenho produtivo. O uso inadequado das fontes de Ca e de P ocasiona prejuízo aos ossos das aves, perdas na qualidade de casca, bem como diminuição da vida produtiva da poedeira (Jardim Filho et al., 2005). A granulometria do calcário deve apresentar baixo teor de sílica e elevadas restrições aos elementos arsênio e flúor (Sampaio e Almeida, 2008). Na prática, para aves de reposição até as 10 semanas de idade é recomendável a ingestão do calcário com granulometria mais fina e, a partir da 10ª, a recomendação é uma dieta com 50% das partículas entre 2 a 4mm para um melhor desenvolvimento do sistema digestório, em particular, a moela.

 

Na fase de produção é importante que haja um equilíbrio entre a proporção de partículas finas e grossas do calcário, as partículas finas de calcário serão mais rapidamente utilizadas pelo organismo e as partículas mais grossas são as responsáveis por uma liberação mais lenta de cálcio, ofertando um aporte durante o período de formação da casca, que dura em torno de 20 horas.

 

Araujo et al. (2011) avaliando o impacto de três níveis de cálcio (3,92; 4,02 e 4,12%) e duas granulometrias do calcário (fina - 0,60 mm; e grossa - 1,00 mm) sobre o desempenho de poedeiras observaram diferenças na produção de ovos, massa, conversão por massa e conversão por dúzia de ovos, obtendo os melhores resultados quando se utilizou o nível de 4,12% de cálcio na dieta. O peso relativo da moela melhorou com o aumento na granulometria do calcário de 0,60 para 1,00 mm. Os autores ainda verificaram efeito da interação entre nível de cálcio e granulometria do calcário para a resistência à quebra da tíbia, a densidade óssea, o comprimento do intestino delgado. Neste estudo, o nível recomendado foi de 4,12% de cálcio e calcário na granulometria grossa (1,00 mm). Pelícia (2008) avaliando níveis de cálcio e granulometria de calcário na dieta de poedeiras relatou que a combinação do nível de cálcio (4,5%) na dieta com substituição do calcário fino pelo grosso em 38% proporciona melhor qualidade de casca e maior número de ovos viáveis para comercialização. Saunders-Blades et al. (2009), afirmaram que dietas contendo partículas grossas de calcário pode melhorar a bem-estar de galinhas poedeiras, reduzindo os casos de osteoporose e prevenindo o sofrimento das aves com ossos quebrando no final do ciclo de produção.

 

O impacto da solubilidade na composição mineral do calcário e na digestibilidade de nutrientes

Os valores de digestibilidade das rações podem variar de acordo com as características do ingrediente que é adicionado. Para o calcário há grande variação no tamanho de partícula, na solubilidade e na concentração de Ca nas fontes, sendo a granulometria uma das principais causas da variabilidade obtida nos resultados (SA & BOYD, 2017). Para o calcário de moagem fina, a solubilidade deve variar entre 50 e 70%, e para o calcário de partículas grossas este valor deve encontrar-se em torno de 20-40%, de acordo com Zhang & Coon (1997). Na prática, deve-se encontrar o equilíbrio entre as proporções de calcário fino e grosso nas rações, levando sempre em consideração a solubilidade da fonte mineral a ser utilizada.

 

Tabela 2. Composição mineral, solubilidade e tamanho de partículas de calcários encontrados no Brasil

Variáveis

Média

Mínimo

Máximo

CV%

Flúor (mg/kg)

456,36

88,46

4.227,77

182,18

Mercúrio (ppb)

8,53

1,92

26,88

78,17

Matéria Mineral (%)

98,93

96,64

99,69

0,68

Cálcio (%)

36,83

33,55

39,07

3,59

Magnésio (%)

0,43

0,12

2,19

108,52

Solubilidade de Calcário (%)

35,61

24,66

51,45

22,29

DGM (μm)

750,36

98,00

3.129,00

114,04

DPG

2,15

1,15

2,70

25,78

Fonte: Krabbe et al., 2014.

 

Como podemos observar na tabela acima, há grande variação nas amostras analisadas das fontes de calcários brasileiros, principalmente nos teores de flúor, magnésio e no diâmetro geométrico médio (DGM) que indica o valor médio do tamanho das partículas da amostra. Os autores ainda ressaltam que a solubilidade é um aspecto que precisa ser melhor avaliado, uma vez que, mesmo amostras com partículas pequenas apresentaram baixa solubilidade.

 

O magnésio é um importante mineral que está presente em quantidades variáveis nas jazidas brasileiras. Porém, para classificar um calcário em calcítico e que o mesmo seja indicado para uso na alimentação das aves e conhecimento de sua solubilidade, deve-se garantir um teor máximo de 3% deste mineral, reduzindo assim a solubilidade do calcário, independente da granulometria, a medida que se reduz o teor de magnésio. Com isso, a solubilidade e granulometria precisam estar equilibradas de tal forma que a ave possa aproveitar de forma eficiente este mineral. O impacto negativo da ingestão de altos teores de magnésio possui ação antagônica ao cálcio, pois competem pelos mesmos sítios de ação e alteram a permeabilidade intestinal, tendo a diarréia como consequência e trazendo consigo problemas, como a maior incidência de ovos sujos.

 

Conforme verificado por Krabbe et al.  (2014), o flúor também apresentou alta variação dentre as fontes de calcário analisadas.  Chang et al. (1977) verificaram que o aumento de flúor na dieta reduz a absorção de fósforo e aumenta a excreção de cálcio, alterando sua deposição óssea e comprometendo todo o metabolismo deste mineral.

 

Considerações finais

A análise periódica da fonte de cálcio utilizada nas rações é de suma importância, pois a alta variabilidade em sua composição e granulometria impacta diretamente na produção de ovos, influenciando desde a deposição mineral na casca, o que afeta parâmetros de qualidade interna e externa, até a maior incidência de ovos sujos e consequentemente contaminados.

 

Referências

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CHANG, Y.O.; PAN, M.; THOMAS, V. The effect of fluoride on calcium absortion in rats. Nutrition Reports International, v.16, p.539-547

JARDIM FILHO R. M.; STRINGHINI, J.H.; CAFÉ, M.B.; LEANDRO, N.S.M.; CUNHA, W.C.P.; NASCIMENTO, J.O. Influência das fontes e granulometria do calcário calcítico sobre o desempenho e qualidade da casca dos ovos de poedeiras comerciais. Acta Scientiarum, v. 27, p. 35-40, 2005.

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ZHANG, B.; COON, C. N. Improved in vitro methods for determining limestone and oyster shell solubility. Journal Applied Poultry Research, v.6, p. 94-99. 1997.

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